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O jovem com Câncer

Reza a lei da natureza que os velhos adoecem e morrem antes dos jovens. Microscopicamente após a divisão celular, a célula mãe entra em apoptose, isto é, morre. Porém existe um evento promovido por mutações genéticas que não permite que as progenitoras desapareçam e elas assistem uma proliferação desenfreada de seus descendentes, até mais de cem gerações adiante, o que promove uma tumefação decorrente dessa superpopulação celular. Uma tumefação, ou tumor.

O câncer, ainda permanece com uma marca estigmatizante muito forte, especialmente por conta do seu aparecimento em pessoas jovens. As doenças cardiovasculares ceifam vidas muito mais que o câncer, em todo o mundo. Porém não é uma doença incidente em crianças e jovens como as neoplasias.

A Organização Mundial da Saúde instituiu um código universal de patologias que permitem registrar com precisão as causas de morte das pessoas. Porém, como sabemos, a expectativa média de vida dos seres humanos nas mais avançadas sociedades não ultrapassa os 81 anos, o que tornaria desnecessário identificar uma causa mortis de um indivíduo de 85 anos, mas mesmo assim ainda a rotulamos. Este código só seria aplicável nos jovens, onde deixar de existir merece um tabelamento que ordene e identifique o evento para planejar modelos que permitam melhorar os resultados.

A Suécia é o país que possui o melhor e mais antigo registro de longevidade humana, e em 1750 um sueco vivia em média até aos 38 anos. Portanto, naquela época morrer jovem não era inusitado. Em castelos europeus é comum existirem inúmeras sepulturas de crianças e jovens, filhos de reis que tiveram 10 a 15 filhos e só vingavam dois ou três. Morrer era um evento esperado, viver era extraordinário.
Conseguimos falar sobre a morte na velhice com muita naturalidade, porém ainda é incompreensível e inaceitável a morte do jovem, especialmente por doenças que nos fazem sentir os nossos entes queridos escorregarem por entre os nossos dedos lentamente, sem que consigamos fazer nada, nos deixando incapazes, só perplexos.
Aos pacientes que desenvolvem câncer, a primeira pergunta que vem à mente é: Por que eu? Para os idosos parentes dos jovens com câncer a pergunta é outra: Por que não eu?

A resposta é a mesma: porque somos fruto de um conjunto de átomos que se organizaram em moléculas complexas, que nos deram forma temporária sob permanentemente mutação e que em algum momento decidiu se desfazer e se reorganizar em outro conjunto, mas que não desapareceu. Só mudou de forma. E essa dança molecular não nos pertence e não obedece aos nossos desejos. Da mesma forma que não nos pertence compreender como e sob qual pretexto nascemos.

Subverter a sequência natural da morte nos castiga, humilha e subjuga a uma força que nunca entenderemos. Só não podemos perder a fé e tentar absorver como um evento esperado comandado pela força brutal da natureza.
Nós estivemos juntos, os confortamos, demonstramos nosso amor, carinho e afeto, diferente daqueles que se foram sob tortura, por guerras estúpidas, ou que sofreram sozinhos sem o nosso abraço e sem o nosso adeus.

Dr. Guilherme Bezerra de Castro
Médico Cirurgião Oncologista e Mastologista